O papel do jornalismo vai muito além da simples divulgação de notícias do cotidiano. Ele é um guardião da memória coletiva e da valorização das tradições culturais que moldam a identidade de uma nação. No contexto brasileiro, um dos exemplos mais vibrantes e significativos dessa cultura popular são as festas juninas.
Quando estamos em junho percebemos o quanto as festas juninas são um pilar da identidade cultural brasileira. Com raízes que remontam às tradições rurais e às celebrações religiosas dos santos populares (Santo Antônio, São João e São Pedro), essas festas são uma expressão autêntica de brasilidade.
Reportagens, documentários, programas especiais e artigos jornalísticos ajudam a manter vivas as práticas e os costumes que, de outra forma, poderiam se perder com o tempo. Por outro lado, o jornalismo acompanha a inovação que acontece no cenário cultural a cada ano.
A comunicação e o jornalismo têm a capacidade de educar e sensibilizar o público sobre a riqueza da nossa diversidade cultural. A divulgação de eventos culturais populares pode ter um impacto significativo na economia local. Não é demais frisar que as festas juninas atraem turistas de diversas partes do Brasil e do mundo, movimentando a economia de cidades e regiões inteiras.
Aproveitando que estamos no mês de junho, trago dois exemplos sobre a movimentação que ocorre nesse período do ano e sobre o papel da comunicação para a cultura popular ao longo do tempo.
A intenção é mostrar para você, jornalista, comunicador e curioso do tema, que existe uma imensidão de cultura aguardando espaço e novos olhares. Se você faz e acredita no jornalismo de qualidade, não deixe nada disso ficar de fora do seu veículo.
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Como tudo em Campina, O Maior e Melhor São João do Mundo, é Grande
Por Karol Oliveira. Jornalista, Doutoranda em Comunicação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), especialista em produção de conteúdo para mídias digitais. Pesquisadora com foco em consumo, redes sociais, mídia e subjetividades.
Entenda porque ao destacar a grandiosidade e a riqueza cultural de Campina Grande, e do que ficou conhecido como o “Maior São João do Mundo”, o jornalismo cumpre um papel essencial na valorização e divulgação da cultura nordestina.
Campina Grande, carinhosamente chamada de Rainha da Borborema, é uma cidade do interior paraibano que se orgulha de suas características de cidade grande. Marinês, uma das vozes mais icônicas da música nordestina, apesar de ser pernambucana, sempre se sentiu campinense de coração, por ter crescido na cidade. Ela dizia em uma de suas canções: “Eu sou pequenininha, mas gosto de tudo grande”, destacando a grandiosidade da cidade que a acolheu.
Essa grandiosidade se manifesta durante as festividades de São João. A cidade começa a se preparar para o evento já em maio, com a instalação das decorações que transformam Campina Grande em um verdadeiro arraial.
Este ano, a festa começou no dia 29 de maio e vai até 30 de junho, esperando atrair mais de 3 milhões de pessoas, entre turistas e moradores. Apesar do título “O Maior São João do Mundo” parecer exagerado para quem não conhece o evento, basta uma visita para entender a razão.
Com uma mega estrutura, atrações variadas e centenas de atividades temáticas espalhadas por toda a cidade, Campina Grande se destaca no cenário dos festejos juninos do Brasil.
Quem visita a cidade durante o São João mergulha em um universo de celebração da cultura nordestina. No Parque do Povo, coração da festa, e no distrito de Galante, a programação inclui shows gratuitos, apresentações folclóricas, quadrilhas e muito forró.
O casamento coletivo, realizado anualmente no Dia dos Namorados, é um evento emocionante, onde mais de 100 casais celebram o amor com uma produção completa fornecida gratuitamente.
Durante todo o mês de junho, a cidade respira forró. Não é incomum encontrar trios de forró pé-de-serra se apresentando em supermercados, shoppings, lojas e restaurantes. O som da zabumba, do triângulo e da sanfona está por toda parte, e o “dois pra lá, dois pra cá” dos casais dançando forró é uma visão constante.
Além da festa, Campina Grande oferece uma rica experiência cultural. O Sítio São João é uma réplica de uma vila antiga, onde os visitantes podem conhecer o tradicional processo de feitura da farinha de mandioca, assistir a shows de forró, saborear comidas típicas e apreciar o artesanato local.
A Vila do Artesão, um espaço municipal onde artesãos produzem e expõem suas obras, se tornou um dos principais pontos turísticos em junho. Com técnicas transmitidas de geração em geração, os artesãos transformam materiais simples em verdadeiras obras de arte.
Para os interessados em história, o Museu de Arte Popular da Paraíba, conhecido como Museu dos 3 Pandeiros, é uma visita imperdível. Projetado pelo renomado arquiteto Oscar Niemeyer, o museu oferece uma visão da música, do artesanato e da literatura de cordel da Paraíba, tudo isso em um design suspenso sobre o Açude Velho, um dos pontos turísticos mais importantes da cidade.
A Rainha da Borborema, com sua mistura única de tradição e modernidade, continua a encantar todos que a visitam, especialmente durante o São João.
Seja dançando forró, assistindo a um casamento coletivo ou explorando seus museus e espaços culturais, a cidade oferece uma experiência inesquecível, celebrando a vibrante cultura nordestina e acolhendo todos de braços abertos.
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Como manter um projeto de comunicação e cultura popular vivo e gerando valor para a audiência?
O programa de rádio “A Hora do Rei do Baião“ está no ar desde 2007. Retransmitido por 15 veículos de diferentes estados do país, tem espaço ao longo dos anos na FM Cultura de Teresina, Piauí.
O movimento colaborativo para a difusão da cultura popular gonzaguiana tem no programa um exemplo de produto de comunicação que, embora enraizado no rádio, dialoga hoje com outros veículos e utiliza plataformas digitais para troca de informações, contatos e redes de interesse.
O apresentador é um comunicador nato. Wilson Seraine é engajado na causa da cultura e múltiplo em suas atividades. Está à frente do programa de rádio, professor de física no Instituto Federal do Piauí (IFPI), autor de diversos livros que abrangem temas da cultura popular, Conselheiro Estadual de Cultura do Piauí, e contribui com sua experiência e visão para o desenvolvimento cultural da região.
Como presidente da 1ª Colônia Gonzaguiana do Brasil, Wilson tem criado diversas ações que colocam a cultura popular e a herança de Luiz Gonzaga como protagonistas de um movimento de exaltação da regionalidade.
Ele nos respondeu perguntas sobre a história do programa e sua opinião sobre a relação entre cultura popular, plataformas digitais e jornalismo.
Como foi o início na rádio e que mudanças foram feitas ao longo dos anos?
Começamos a transmitir o programa na FM Cultura no dia 8 de março de 2007, com o mesmo nome que temos ainda hoje, “A Hora do Rei do Baião”. Inicialmente, o programa era transmitido ao vivo, mas posteriormente passou a ser gravado, o que trouxe melhorias significativas.
Com isso, começamos a criar blocos temáticos, incluindo músicas raras, curiosidades, músicas em outros idiomas, e destacando artistas que cantaram Luiz Gonzaga em vida ou os que ainda estavam fazendo essas homenagens. Foi quando colocamos também nossa parte de pesquisa que já vinha sendo feita há muitos anos, abordando temas e convidando entrevistados. Isso só foi melhorando a repercussão de forma positiva. Estamos lá todos esses anos e ninguém mexe com nosso programa.
Que ganhos o programa teve com a chegada mais forte das plataformas digitais?
Hoje é possível ouvir o programa pela internet e, atualmente, 15 rádios do Brasil retransmitem. E isso se deu por esse contato com pessoas que eu nem conhecia. Temos essa colaboração de retransmissão em rádios do Piauí, Ceará, e Pernambuco, além de oito web rádios entre Ceará, Pernambuco, Distrito Federal e São Paulo.
Com o advento do WhatsApp, Facebook e Instagram, muitas pessoas passaram a nos conhecer. Com esses canais, recebi convites para palestras e eventos. Houve também uma maior demanda da sociedade local por palestras sobre cultura nordestina e Luiz Gonzaga, o que nos levou a diversos lugares e a abordar diferentes aspectos dessa rica cultura.
As festas juninas são um grande momento de exaltação da cultura regional, especialmente nos estados do Nordeste. O que podemos destacar que fazem destas festas um evento tão fundamental e que merece um olhar especial do jornalismo?
Não há nada igual às festas juninas em nossa cultura. Falo isso e o povo até acha exagero, mas veja: elas possuem músicas próprias, danças, figurinos, adereços, decorações, e comidas típicas, além de datas fixas no calendário. Tem também um caráter religioso, cultural e um ícone próprio que é Luiz Gonzaga. Não há outra festa com tantos elementos únicos e próprios que seja tão representativa e que contribua tanto para a cultura brasileira.
Como um comunicador que atua há tantos anos, como você vê o papel da imprensa na cobertura desses eventos e na valorização da cultura popular?
Colaboramos com veículos da imprensa nos eventos que realizamos, e eles participam ativamente, pelo menos a nível local temos essa experiência. Mas a cultura popular ainda não é amplamente consumida, muitas vezes vista como algo sem rendimento econômico. No entanto, é importante destacar que uma parte significativa do PIB brasileiro vem da cultura, que gera renda e emprego. É um sistema que vai além da atividade artística, com muitas pessoas envolvidas na geração de empregabilidade. Valorizar a cultura local é crucial, pois, sem uma cultura forte, acabamos absorvendo as de outros lugares e as nossas vão se perdendo.