O final de ano é aquele momento em que passado e futuro se sobrepõem em uma dinâmica de avaliação da vida pessoal e profissional, da vida em sociedade, dos negócios. Para um mercado em constante transformação como o de mídia, comunicação e jornalismo, impactado pela desinformação e constante busca de credibilidade, as ações estratégicas são pressupostas para prospectar um novo ciclo mais próspero.
Encerramos 2024 com mais de 5 mil downloads do livro “Jornalismo Local no Brasil: Caminhos Possíveis”, um guia estratégico, apontando aos veículos de jornalismo locais e regionais formas de fazer a travessia. O livro, do qual fui uma das autoras, moldou a atuação de muitos veículos, como também abriu espaço para debates necessários. Para alguns veículos, as diretrizes do guia são metas cumpridas, para outros, novas promessas de realização.
2025 está batendo à porta e o fato é que novas tendências já se impuseram. A emergência climática e a mediação da imprensa são uma pauta urgente e devemos endereçá-la, bem como a integridade da informação, inclusive ambiental, temáticas estruturantes do futuro. Por isso, escolhi o blockchain como tendência chave, pois entrelaça as duas pautas. Precisamos perseguir o domínio dessa tecnologia primeiro, para depois a incluirmos na estratégia.
O que é o blockchain e por que prestar atenção?
Blockchain tem o poder de transformar radicalmente o jornalismo, colocando o poder nas mãos dos leitores e restaurando a confiança na mídia, oferecendo soluções inovadoras para desafios como a transparência, a segurança e a monetização de conteúdo.
Ao permitir a criação de registros inalteráveis e a verificação da autenticidade de informações, o blockchain pode fortalecer a confiança do público nas notícias e combater a desinformação.
Embora ainda existam desafios a serem superados, a adoção do blockchain por grandes
empresas e a crescente conscientização sobre seus benefícios indicam que essa tecnologia desempenhará um papel cada vez mais importante no futuro do jornalismo. Mesmo gigantes da tecnologia como a Google reconhecem o potencial disruptivo do blockchain e estão investindo em soluções baseadas nessa tecnologia.
Houve anúncio de programas para parceiros desenvolveram aplicativos de web 3 (internet descentralizada) baseados em blockchain e, mais do que isso, fechou parcerias com redes como Hedera, Polygon, Solana Labs e Flare para serviços de validação de documentos e dados e fomento à inovação. Eu arrisco afirmar que é uma tecnologia paradigmática, talvez a mais importante desde o protocolo www.
Listei abaixo alguns motivos para dedicar tempo e experimentação para essa tecnologia em 2025:
1. Transparência e credibilidade: O blockchain permite o registro imutável de informações, ou seja, a integridade noticiosa. Isso significa que a origem e a evolução de uma matéria jornalística podem ser verificadas por qualquer pessoa. Em um contexto de desinformação exponencial, essa tecnologia introduz um selo de confiabilidade atribuído pela audiência.
2. Monetização e propriedade digital: Os NFTs (tokens não fungíveis) permitem que jornalistas vendam suas reportagens como obras de arte únicas, com um certificado digital que comprova a autoria e a exclusividade. Essa é uma forma de recuperar a ideia de valor do jornalismo, oferecendo à audiência a possibilidade de apoiar diretamente a produção de qualidade.
3. Pagamentos diretos e micropagamentos: O blockchain facilita o uso de criptomoedas ou sistemas de micropagamentos em moeda corrente. Isso significa que o leitor pode pagar diretamente por uma matéria, sem intermediação de grandes plataformas, reduzindo custos e fortalecendo a relação entre produtores e consumidores de conteúdo.
4. Segurança de dados e privacidade: Em um momento em que o uso de dados pessoais está sob crescente escrutínio, o blockchain oferece soluções para armazenar informações com segurança, protegendo tanto as fontes quanto os leitores.
Por que a tecnologia blockchain assusta?
Apesar de promissor, o blockchain ainda enfrenta muitos desafios, como a escalabilidade e a acessibilidade. A implementação da tecnologia em larga escala requer investimentos significativos e uma curva de aprendizado que pode afastar pequenos e médios veículos, num primeiro momento. Porém, tem aquela máxima que gosto de repetir: sozinhos vamos mais rápido, juntos vamos mais longe.
A colaboração segue sendo tendência para 2025, inclusive para enfrentar novos desafios. Muitos profissionais ainda veem o blockchain como algo distante, ou atrelado exclusivamente a criptomoedas.
Essa percepção pode dificultar a adesão e retardar a utilização no setor. Outro ponto desafiador para a tecnologia blockchain é o consumo de energia. Dependendo da arquitetura, pode consumir altos níveis de energia, gerando impactos ambientais significativos. Isso é especialmente preocupante diante do aumento de eventos climáticos extremos como enchentes, secas e furacões, que têm exigido um olhar mais atento da imprensa para pautas climáticas.
Uma alternativa é adotar soluções blockchain que utilizem mecanismos de validação e consenso mais sustentáveis, como um sistema de validação de transações que priorize quem possui mais moedas. É o caso do proof-of-stake (PoS), método que exige menor força de mineração computacional complexa.
O sistema PoS pode ser usado para armazenar e proteger arquivos de notícias de forma descentralizada.
Embora os validadores não armazenem os arquivos diretamente, eles garantem a integridade dos registros associados a esses arquivos, como autorias, datas de publicação e revisões, contribuindo para a redução da pegada ambiental enquanto oferecem credibilidade e segurança aos seus leitores.
Há ainda a questão das regulações em torno do blockchain, que precisam entrar no debate público. Questões legais, como a proteção de dados e a tributação de transações, podem criar barreiras para sua implementação em larga escala no jornalismo, num primeiro momento.
Um novo modelo de negócio na comunicação: o público é o rei
O público consumidor é rei neste novo modelo porque o blockchain descentraliza a circulação de notícias e publicidade, eliminando intermediários (hoje plataformas e algoritmos) e devolve ao público o controle sobre o que consome e apoia. O consumidor pode pagar diretamente por conteúdo, decidir quais projetos financiar e verificar a autenticidade das informações.
Além disso, a publicidade torna-se mais transparente e menos invasiva, respeitando a privacidade e reforçando o engajamento com as marcas e veículos que melhor atendem às suas demandas. Essa combinação de escolha, transparência e controle coloca o poder nas mãos da audiência como nunca antes.
Todas essas mudanças têm algo em comum: colocam o poder de decisão e consumo cada vez mais nas mãos do consumidor. A proposta é vermos a migração de uma lógica de circulação centrada em algoritmos para uma lógica centrada na tomada de decisão por bloco.
O blockchain, embora ainda em fase inicial de adoção no jornalismo, conduz essa transição. Ele carrega o potencial de redefinir o que entendemos por transparência, viabilidade financeira e relação com o público. Para jornalistas e veículos, o desafio é se preparar para um mundo onde a transformação não é apenas desejável, mas vital.
Em 2025, mais do que nunca, o jornalismo será chamado a inovar não apenas em suas narrativas, mas também em seus modelos de existência. O blockchain é uma dessas ferramentas, e cabe a nós explorá-la de forma ética, criativa e transformadora. Esteja pronto para 2025, um ano de menos investimentos em mídias sociais, já ficando velhas, e mais em novas mídias.